Páginas

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Sobre quem não sabe ser feliz

     Quem dera fosse possível abandonar completamente o eu. Eu, esta identidade destrutiva, que não se cansa de destruir toda e qualquer coisa, seja boa ou ruim, seja até mesmo a melhor de todas as coisas. O eu tem a necessidade de sabotar a si mesmo de uma maneira impressionante. Veja, todas estas palavras surgem do mais sincero pesar do que está para morrer a seguir, porque se você pensa que o eu está te sabotando, você já foi sabotado. Sinto o peso de tudo que já me foi tirado por mim mesma, sinto até mesmo o peso do que estou pra me tirar, este é mesmo o pior dos pesos, pois não sei como me ajudar. A identidade, etiqueta, definição limitada, delimitação, impede-me de ser livre, impede-me de poder ser sincera comigo mesma, impede-me de conseguir falar que me sinto usada. Sinto-me completamente usada, pois tenho que seguir uma agenda que não é minha. Tenho que me adequar a padrões que ferem a identidade do eu, e quando o eu é ferido ele precisa se defender, mesmo que esta defesa cause sofrimento. Sofro antecipadamente porque morte é algo com o qual não somos ensinados a saber lidar. Algo precisa morrer hoje para que a vida em seu curso mais livre e natural continue a existir. Veja, eu sofro de uma dor terrível, dói-me esta capacidade de me cortar em palavras, enquanto preciso maquiar todo o sofrimento para defender uma identidade. Estou escolhendo uma identidade sobre o amor, porque a defesa da identidade é um ataque ao qual eu estou desprotegida. Amor só reconhece amor, mas estou afundada em apego e carência e esse bolo na garganta não me deixa respirar. Algo precisa morrer hoje, porque a morte é inevitável, quem dera fosse possível matar apenas este eu.

Um comentário:

Causticidade Cotidiana disse...

Nascer como eu e morrer como eu é um privilégio que nos foi concedido, mas que nos foi tirado tão logo o recebemos. Não podemos ser eu, temos que ser a identidade. Não podemos seguir nossas ideias, nossos padrões. Não podemos ser eu porque é errado aos olhos de quem criou uma identidade a ser seguida, uma identidade a qual logo percebemos que estamos nos tornando.
Eu não queria estar onde estou hoje. Eu queria ser eu, mas não pude ser. Hoje sou uma identidade, sou mais um sem destaque no meio de uma multidão de identidades caracterizadas por padrões pré-definidos. Sociedade utópica ou distópica? Em uma ou em outra, temos padrões estabelecidos, temos pessoas condicionadas. E o que é o condicionamento se não a repetição incessante de que devemos ser algo, seguir algo, possuir algo? "Sessenta e duas mil repetições fazem uma verdade", diz Aldous Huxley em Admirável Mundo Novo, ao passo que (vou citar novamente esse cara) Chuck Palahniuk nos diz através de Tyler Durden em Clube da Luta que "devemos destruir tudo por dentro para construirmos algo melhor em nós mesmos". Ao fim, fica a pergunta: Devemos destruir o eu para construir uma identidade, através de tudo aquilo que nos é dito, ensinado, condicionado ao longo de nossas vidas, ou destruímos a identidade para ser quem realmente somos?
E sim, algo precisa morrer, basta saber escolher se quer que morra o eu ou a identidade.
Eu sempre tento escrever pouco nos comentários, mas seus textos me levam a outra dimensão, Marina!

Paulo.

Postar um comentário